Fernando Diniz inicia nova era na Seleção. Ou não?

Levando em consideração a carreira do treinador até aqui, muitos esperam que ele seja revolucionário. Mas isso é necessário?

Fernando Diniz é o centro de uma das maiores polarizações do futebol brasileiro nos últimos anos. Todos têm uma opinião sobre o treinador, praticamente não existe alguém que seja neutro em relação ao trabalho dele. Desde sua campanha no Campeonato Paulista de 2015, em que ele levou o modesto Grêmio Audax à final do Torneio, em todos os clubes que ele passou ele dividiu opiniões entre os torcedores. Metade não querendo ver o treinador nem “pintado de ouro na sua frente”, e a outra parte de “Dinizistas” que sentem falta do estilo de jogo que ele implanta em todos os seus trabalhos.

A única coisa que é irrefutável a respeito de Fernando Diniz é que ele é diferente. A maneira que ele faz os times dele atuar é diferente do que faz qualquer outro treinador. E é justamente daí que vem a polarização. É da natureza humana temer o desconhecido, e muitas vezes acabar rejeitando quem faz algo distinto do que nos habituamos a ver.

Foto: Maílson Santana/Fluminense

Agora, muitos o consideram um revolucionário, o que também é um exagero. É verdade que ele desenvolveu uma maneira bem própria de atuar, não há outro treinador no mundo que faça uma equipe jogar da mesma maneira de Fernando Diniz, mas isto não caracteriza uma revolução, e nem quer dizer que ele é um gênio. É apenas um treinador que tem ideias próprias de jogo, e a elas se mantêm fiel.

Uma característica comum a todos os trabalhos dele até aqui é conseguir implantar rapidamente os seus conceitos, de maneira que seja perceptível em campo, independentemente do elenco que ele tem em mãos. Então não se espera que isso seja diferente agora que ele treina a seleção brasileira. Mas será que ele vai protagonizar uma revolução? Ou melhor, ele tem motivos para chegar e querer mudar tudo? Sua primeira convocação é um indício de que não.

Obviamente não estou dizendo que não ocorrerão mudanças. Se ele conseguir implantar o seu estilo, como se espera, isso já será uma mudança. Ele e Tite são dois excelentes treinadores com estilos de jogo totalmente diferentes. O técnico que comandou a seleção na última Copa era adepto do jogo posicional, ou seja, os jogadores sempre estavam em uma formação tática muito bem definida, com movimentos organizados, sempre se preocupando com o posicionamento em campo, para desta forma envolver o time adversário.

A maneira de jogar do Tite era muito eficiente, por mais que tenha tido maus resultados em Copas do Mundo. Afinal, não podemos basear a análise de um trabalho de seis anos apenas em um torneio de sete jogos disputados ao longo de 30 dias. A questão é que o jogo posicional é algo muito característico do futebol europeu, enquanto o estilo de Diniz é mais semelhante à raiz do futebol brasileiro.

O atual treinador é mais adepto de conceitos relacionistas, o que quer dizer que os jogadores têm muito mais liberdade para se movimentar em campo, independentemente da sua posição de origem. A ideia central é progredir em direção à meta adversária com aproximações e tabelas. Além disso, a marca registrada de Fernando Diniz é aglomerar vários jogadores em um mesmo setor do campo para trabalharem com toques curtos, em vez de tentar espaçar o time adversário. Sem dúvida, o trabalho dele em que é possível se observar estas características com mais clareza é o do Fluminense. Muito pelo fato do clube ter dado mais tempo para o técnico desenvolver suas ideias.

Foto: Marcelo Gonçalves / FFC

Mas mesmo que ele tenha conceitos bem diferentes do técnico anterior, após a convocação podemos projetar um time titular parecido com o que tínhamos no último ciclo. Ainda que quase metade da lista de Diniz não tenha atuado na última Copa, não devem haver grandes mudanças na escalação principal. Não tem como saber com certeza como ele vai montar a equipe nas primeiras rodadas de eliminatórias. Particularmente eu imagino que ele vá montar um 4-2-3-1, mesmo esquema que ele utiliza no Fluminense, tendo Alisson ou Ederson; Danilo, Marquinhos, Gabriel Magalhães e Caio Henrique; Casemiro e Bruno Guimarães; Vini Jr., Neymar e Rodrygo; e Richarlison. Apenas quatro mudanças em relação ao time base da última Copa do Mundo. Isso sem levar em consideração o corte de Paquetá, que poderia ser titular do time.

É claro que a maneira de atuar será diferente, e deve ser facilmente assimilada levando em conta o nível dos jogadores que ele tem à disposição. Mas por mais que o time jogue com um estilo diferente, o trabalho dele vai depender de resultado, tanto quanto o de qualquer outro técnico do futebol brasileiro, principalmente se falando de seleção.

Além disso, temos que nos lembrar do principal. O contrato dele é de apenas um ano, quando se espera a chegada do italiano Carlo Ancelotti. É claro que não temos nenhuma garantia de que ele virá, mas levando em consideração que a CBF já deu como certa a vinda dele publicamente, devemos trabalhar com esta possibilidade. E isso não exclui o Diniz.

Por que ele faria um trabalho de “revolução” ou de mudar totalmente a identidade da equipe, apenas com jogadores que se sentem confortáveis em seu estilo de jogo, se em junho do ano que vem ele entregará o cargo para outro treinador que também tem ideias de jogo bem diferentes?

Em suma, por mais que o Diniz seja considerado transgressor por boa parte dos que acompanham o futebol brasileiro, o que é compreensível por ele ser diferente dos outros treinadores, ele não é um revolucionário. E ainda que fosse, ele não tem porque mudar radicalmente tudo que era feito na seleção brasileira, levando em conta que ele ficará apenas por um ano, e que o trabalho anterior foi muito bem executado. É claro que sentiremos diferença na maneira de atuar da seleção, e é de se esperar um estilo vistoso e divertido de acompanhar, como vimos em todos os trabalhos de sua carreira. Ainda assim, isso não caracteriza a famigerada “revolução”.

Publicado em: 19 de Agosto, 2023 por Pedro P. Lima

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